quarta-feira, 27 de agosto de 2014

[Feliz?] Dia do Psicólogo.

"Dia 27 de agosto. Dia do Psicólogo.
Esse ano eu não vou escrever em como sou orgulhosa em fazer algo que eu gosto. Em como eu me sinto feliz por poder, de alguma forma, tornar a vida de algumas pessoas um pouco menos dolorosa.
Esse ano eu não vou escrever como a nossa profissão é importante para a sociedade. Eu não vou escrever como milhares de psicólogos fazem a diferença em escolas, clínicas, hospitais, organizações, dentre outros espaços. De fato, os bons psicólogos conseguem fazer intervenções e mudanças na nossa sociedade.
Esse ano eu quero escrever como nossa profissão é pouco reconhecida e valorizada. Eu quero escrever sobre os salários baixíssimos nos equipamentos de saúde, nas clínicas, nas organizações. Quero escrever sobre os estágios que mais se escraviza do que se ensina. Quero escrever sobre professores que estão mais preocupados com o lattes do que com boas aulas. Quero escrever como nossa classe é desunida. Quero escrever como às vezes eu me sinto extremamente desestimulada em continuar a saga de poder ser uma boa professora, como também uma boa psicóloga.
Quero escrever sobre as altas mensalidades dos cursos de especialização e formação. Quero escrever sobre inúmeros psicólogos que estão muitas vezes exercendo a profissão, mas não sabem o que estão fazendo, estando naquele local por indicação, não por merecimento e competência. Eu também quero escrever sobre inúmeros psicólogos que estavam ou estão desempregados, mas são extremamente competentes. Quero escrever sobre inúmeros colegas que estão descontentes com os rumos da nossa profissão.
Hoje eu recebi em minha casa um panfleto de uma empresa: “Feliz dia do psicólogo”. Todos os anos recebo algo do tipo. Lembro-me que em 2011, recém-formada, fiz um texto falando como eu estava feliz em ter escolhido essa profissão. Em 2014, praticamente terminando um mestrado, sinto-me extremamente incomodada com as comemorações e as frases de jargão “feliz dia”.
Tem alguma coisa muito errada acontecendo com a formação do psicólogo. E parece que ninguém pensa nisso. Ou se pensa pouco. Não é de se admirar que no dia do psicólogo tudo que seja veiculado seja “feliz dia”. Mais do que nunca, no nosso dia, deveríamos colocar em evidência e em xeque essa formação, e, além do mais, essa pós-formação.
Não, nesse ano não quero ser parabenizada. Nesse ano desejo, do fundo do meu coração, que alguma coisa mude. Ou que pelo menos a gente comece a pensar nisso. E, mais do que nunca, não coloque a sujeira debaixo do tapete e finja que nada acontece... porque acontece. E vocês, colegas de profissão, sabem disso." (Lorrana Castelo)

domingo, 2 de março de 2014

Sobre essa gente doente.

“Os seres humanos me assombram.”
Essa frase lateja na minha cabeça praticamente todo dia. Sempre que vejo uma notícia de algo absurdo que alguém fez. Quando alguém mata, tortura, destrói, humilha, machuca ou magoa outro alguém, outro ser, sei lá. Os casos variam de assassinatos a humilhação em público: em troco de nada, sem razão, sem por que. Hoje, por exemplo, foi isso, humilhação. Uma pessoa que, sem nenhum motivo, decide gritar pra outra pessoa que ele não conhece coisas ofensivas e humilhantes no meio de um engarrafamento. Alguém decide que pode ofender e dar palpite na vida de outra pessoa que não conhece e que é “ok” gerar esse tipo de constrangimento a alguém. Bom, primeiro, o que me conforta é que tudo que nós fazemos volta pra gente. Sim, volta. Esse sujeito irá receber o troco. E não vai ser eu, a pessoa ofendida ou outra pessoa que viu e se sensibilizou por ela. Vai ser a vida mesmo.
Mas não há como não se questionar: o que é que falta, afinal, nesses seres humanos? Falta sensibilidade pra se importar com os demais? Falta noção pra perceber quando seu comentário não é bem vindo, não é oportuno e, além disso, é humilhante? Falta humanidade? Porque, convenhamos, não é, e eu espero que nunca seja, normal alguém fazer isso.
Pra algumas pessoas essas situações servem como combustível. Alguma coisa do tipo “vou usar isso como força pra mudar e não ouvir coisas desse tipo nunca mais”. É bonito, muita gente muda, nunca mais escuta coisa desse tipo e etc e tal. Mas e as outras pessoas que estão na mesma situação? Quantas pessoas já escutaram, vão escutar, vão tentar mudar e não vão conseguir e vão continuar escutando e vão sempre ter medo de ouvir qualquer besteira desse tipo em um outro engarrafamento qualquer? Coisas desse tipo poderiam servir de combustível para mim, mas me fazem querer continuar a ser o que eu sou e mostrar que não – você não pode me humilhar, humilhar qualquer outra pessoa porque você acha que pode. Porque não importa quem sou, como estou vestida, qual é o meu peso, qual é a minha cor ou minha preferência sexual: ninguém pode opinar sobre a minha vida no meio de um engarrafamento ou em qualquer outro lugar me causando constrangimento e dor. Não, ninguém pode. E não é com a mudança das pessoas que foram ofendidas que os malditos donos-do-mundo vão ser silenciados. Sempre vai existir outra pessoa para ser constrangida e humilhada por esse tipo de gente que goza gerando dor nas pessoas.
Quando eu mudar alguma coisa em mim vai ser porque eu quero. Porque eu sinto necessidade. Não porque alguém gritou que eu devia fazer tal coisa. E eu espero que algum dia esse grito volte e todos vocês – que ofendem e humilham outras pessoas por razões que na verdade não são razões e não são motivos – possam um dia encontrar noção, sensibilidade e humanidade. Seria um bom começo.